quarta-feira, 5 de maio de 2010

Escultura de fumaça



Tenho em mim as pontas dos punhais
as lâminas lambidas das espadas polidas
a vertigem dos sem nome
e você envolto em fumaça num altar com uma vela queimando
a naftalina me dá aftas
bebi tua fumaça numa única golada fiquei bêbada de irrelevâncias
minha vestal meu incensário meu dicionário de capa dura edição de 1943 comido por traças alfabetizadas

coitados dos imortais que sempre serão lembrados por seus defeitos

pois um defeito imortal é sempre maior que um acerto imortal

coitadas das imagens do passado que não tiveram a chance de errar

pois o espírito saudosista não nos deixa nunca lembrar dos beliscões doloridos e das bengaladas nas canelas, só vemos dias floridos e empadinhas de queijo

coitadas das flores que nunca tiveram o direito de serem feias

ninguém é capaz de amar as flores

não se ama o belo tão sinceramente quanto se ama o feio

não se ama o eterno tão sinceramente quanto se ama o finito

as irrelevâncias me consumem
absorvo a importância de ser fumaça
como o pensamento mais rápido sem rastros nem rabo
passar sem belas formas e ser amado
engolido como fumaça
como se intoxicasse o ser de brevidades




Isa Blue

Um comentário:

  1. realmente não se ama o belo com a verdade com que se ama o feio.

    amar o belo é fácil, ao feio é difícil. Me lembrei da menina do conto do bukowski " a mulher mais linda da cidade"...

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